terça-feira, 11 de agosto de 2009

E tome orações


As manifestações tem se multiplicado. Pessoal se preocupa.
As mais devotas se deitam em orações.
Engraçado me mandarem orações. Equivale a mandar uma garrafa de água mineral para um dono de fonte. Orações é o que mais tenho feito. Ainda precisa que façam pra mim?
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Pois então veja mais esta, seu cabeça-dura:
Santa Clara, Clareia os caminhos tortuosos Daqueles que se embrenham Na noite do próprio egoísmo E nas trevas do isolamento. Clara, irmã de São Francisco, Coloca em nossos corações A paixão pela simplicidade,

Quem fez esta composição, por acaso estava em algum baile? E como ela supõe que Sidharta, por exemplo, encontrasse a iluminação, senão que pelo isolamento, pela meditação, pelo pensar, jejuar, esperar? No torvelinho das paixões, no meio das comemorações, por manifestações de massa, o que se pode esperar senão a confusão em larga escala? E me fala em simplicidade... o que pode ser mais simples do que um indivíduo? E porque confundir isolamento com egoismo, quando é justamente o contrário, ou seja, é justamente por não ser egoísta, por ser desprovido de ambição, por não desejar nada para si que não há necessidade de peregrinar no meio das gentes? Que egoísmo pode ser satisfeito sem nenhuma circunstância para ser apropriada? Não, meu caro salva-vidas de araque,, definitivamente não. Esse tipo de oração revela sua origem, e o meio escolhido aponta apenas a mesma finalidade: conduzir o incauto à metafísica de cordel, por meio de dialéticas aparentemente razoáveis, porém sem o menor conteúdo designativo.

Mas você prefere supor que quem lhe dedica atenção, não merece seu reconhecimento?
Tento compreender. Veja que a atenção dispensada parte de pressupostos, de um preconceito, que é um conceito emitido antes de propriamente conhecer o que se tem como ponto da determinação. Neste caso, não me parece coisa de muito amor, porque este requer compreensão, não o julgamento, ainda mais antecipado, ambos sempre calcados na presunção. A emissora age como toca-fitas: rrepete gravações de aplicação universal, não pessoal. É certo que a oradora nunca me viu, e sequer conhece algum trabalho que elaboro. É um falso interesse, que busca admiração apenas para si.
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Então não devo agradecer?
Não disse isso. Quem me dirige atenção per se merece a minha. Esta pessoa deve ser de boa-fé. Por isso foi facilmente embretada pela mistificação como panaceia para qualquer conquista. Eu é que preciso compor uma oração para oferecê-la. Por certo, como todos, ela passa lá por seus momentos de aflição. Então, se agarra nos santos, nas orações. Quando as atribulações amenizam, ela reputa à mágica celestial invocada. É incapaz de supor que a vida é uma constante formulação de ondas, e para que estas existam, há previamente repuxos, tanto quanto para o sol raiar antecede-lhe o crespúsculo. Sosseguem todos os corações. Nem querendo posso me isolar. Faço parte do Universo, e como tal, da eternidade. Recebo a energia cósmica permanentemente, e por out-put tenho que retransmiti-la. Sou apenas um recipiente provisório, no qual meu espírito se aloja, de onde recebe e emite inúmeros congêneres, entre os quais os daqueles que me são mais caros, na pole-position da convergência de meus sentimentos. Agradeça lhe orientando: se ela quiser ingressar no rol, se quiser uma garupa, o lado do estribo é o esquerdo, o do coração, e não o direito, como presume a pretensa racionalidade.

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